Anda por aí um grupo de carpideiras indignadas com as pessoas
que reagiram com veemência, nas redes sociais e no site do Público, a uma
notícia assinada por Clara Viana sobre
a manif em defesa da escola pública. Dizia-se na notícia que estavam duas mil
pessoas quando a manif começou.
Não sei qual o momento em que a Clara Viana escreveu, mas
não foi no início da manif, certamente,
porque nessa altura já havia muitos milhares de pessoas no Marquês. A
indignação de leitores e manifestantes poderá ter sido, por vezes, exagerada, mas
as desculpas que hoje começaram por aí a circular são uma tontice. Não as cito
aqui, porque muita gente já as terá lido e também não dou cobertura a
argumentos que invocam questões técnicas para justificar uma notícia falsa.
E não o faço apenas
pela pobreza dos argumentos, mas também porque as falsidades da notícia
não se limitam ao número manifestantes presentes, mas também a factos que na
realidade não ocorreram, como a presença de Jerónimo de Sousa e Catarina
Martins no palco dos oradores.
Corporativamente, a defesa de Clara Viana pelos seus pares,
é compreensível e aceitável. Como jornalista, também já saí muitas vezes em
defesa dos meus pares. Tive, porém, sempre
a sensatez de não insultar quem os criticou, como fez Ana Sá Lopes
ao apelidar os críticos de bêbados.
Não pode, por outro lado,
Clara Viana nem qualquer jornalista
esquecer que mais do que a fidelidade a quem lhe paga, tem uma obrigação de
fidelidade aos leitores. E isso passa, inequivocamente, por ser honesto e verdadeiro
nas notícias que dá.
Ora acontece que o Público também mentiu quando noticiou a
manif das canárias das escolas privadas. Dessa vez ampliou os números. Ontem,
encolheu-os. Ou seja, o Publico calcula o número de pessoas em função dos
interesses que quer servir. Como o árbitro que só vê os penalties que favorecem
a equipa do seu coração. O jornalismo não é opinião. Nem notícias fabricadas à
mesa de um café da Av. de Roma O jornalismo faz-se com factos. E os factos relatados pela Clara Viana não jogam lá muito bem com a realidade. Nem
com a verdade. E nem sequer o calor serve de desculpa para tanta mentira.
Dizem as defensoras de Clara Viana que a culpa das
falsidades da notícia não é da jornalista.
A culpa será de outrem no jornal
(que não identificam) e de um pormenor tecnológico duvidoso. Admito que seja
verdade mas, nesse caso, ela sabe como
se pode defender. E era bom que o fizesse, em nome dos leitores que apreciam o
seu trabalho. Quanto ao Público, já não precisa de fazer nada para ser um
jornal credível. Há muito perdeu a oportunidade de mostrar que aquele episódio
da Av de Roma foi meramente acidental. Pelo contrário, todos os dias temos
provas de que o jornalismo por ali está circunscrito a um reduzidíssimo número de
profissionais.
Deixem-se de tretas: a acérrima defesa de Clara Viana pelas
suas amigas visa, acima de tudo, lançar uma cortina de fumo que desvalorize a
manif de sábado e desvie as atenções da manipulação orquestrada por alguma
comunicação social que apoia descaradamente as escolas privadas.
Seria bom que soubéssemos quais os interesses que movem
alguns dos detentores de órgãos de comunicação social mas, como já aprendemos
com os Panama Papers, quando saltam para a ribalta notícias sobre o envolvimento
de jornalistas e detentores de órgãos de comunicação social, as notícias
esfumam-se, a investigação suspende-se e
não se fala mais nisso.
Em tempo: o pedido de demissão de Clara Viana feito pela
deputada Gabriela Canavilhas ( o exemplo das ameaças de Relvas a jornalistas
deixou frutos) é descabelado e inadmissível, mas não se empole a disparatada
reacção de uma deputada, para escamotear a manipulação noticiosa prosseguida
pelo “Público”.