Hoje em dia, o acesso à informação está à distância de um clique. Num único site, podemos encontrar a informação de jornais de todo o mundo. Os canais de televisão inundam-nos de informação. Há publicações especializadas para nichos de mercado. A blogosfera e as redes sociais são veículos privilegiados onde podemos debater, em tempo real, o que se vai passando no mundo ou no nosso restrito círculo de amigos.
Apesar de tanta informação, disponível à distância de um clique, hoje temos de ser muito mais selectivos do que há 40 anos. Por um lado, porque temos de escolher mais criteriosamente a informação que nos interessa, por outro porque temos de estar mais atentos aos detentores dos órgãos de comunicação social que, cada vez mais, os utilizam de acordo com interesses políticos e económico.
Precisamos de saber ler nas entrelinhas, como no tempo da censura. Não porque haja falta de liberdade de expressão, mas porque a informação generalista é cada vez mais standardizada e liofilizada, defende mais os interesses dos patrões do que o dos leitores.
Em matéria de política internacional, as notícias são-nos “vendidas” com dois critérios: sensacionalismo que explora a morbidez e voyeurismo dos leitores e perspectiva dos acontecimentos mundiais moldada na visão do munod ocidental onde mora o bem. O mal está sempre para lá do Equador, ou no Extremo Oriente, figurantes menores de um mundo global, dominado pelo Ocidente. Por enquanto…
Há 40 anos era bastante diferente. 
O ardina, com a sua inseparável sacola
A imprensa escrita era dominante e comprar um jornal um hábito diário. Mesmo em Portugal, onde havia censura, as pessoas não dispensavam pelo menos um jornal diário e habituaram-se a ler nas entrelinhas, aquilo que a Censura cortava, mas o jornalista tinha arte para ludibriar.
No Porto e em Lisboa, compravam-se pelo menos dois, pois havia jornais vespertinos, que saíam à rua depois das cinco da tarde. O Diário do Norte era o vespertino do Porto e arredores, mas em Lisboa havia sempre três opções: Capital, Diário de Lisboa e Diário Popular.
Os jornais eram também entretenimento e, naquela época, funcionavam como uma espécie de rede social. Quantos namoros não começaram à custa das palavras cruzadas que se faziam em conjunto? Na Grãfina e na Suprema, em Lisboa, se começaram a desenhar alguns casamentos, enquanto ela perguntava " o que é suíno com duas letras" e o Tó, enlevado, respondia " sou eu"…
Muitas crianças ( entre as quais me incluo) aprenderam a ler nas páginas dos jornais. Nesse tempo, o ardina era a Internet a que tínhamos acesso. Pela manhã distribuía os jornais pelas casas dos fregueses. Bem cedinho, para que pudessem dar uma primeira leitura ao pequeno almoço, antes de irem trabalhar. Os ardinas eram verdadeiros artistas na arte do arremesso. Da rua, conseguiam fazer aterrar um jornal na varanda de um sétimo andar ( naquela época as marquises ainda não faziam parte da estética urbana) com uma precisão que me deixava fascinado.
Cumprida a tarefa da distribuição, vinham para a rua anunciar os jornais entoando pregões. Um deles ficou bem célebre. “ Lisboa, Capital, República, Popular” gritavam alguns ardinas pelas ruas de Lisboa, ao final da tarde, utilizando o nome dos três vespertinos e do jornal República (que, se a memória não me atraiçoa, saía ao final da manhã) num acinte divertido ao Estado Novo.
O ardina era uma figura indissociável dos jornais e o seu melhor promotor. Em cada dia, sabia destacar os melhores títulos para aguçar o apetite de quem passava. Principalmente ao final da tarde quando, de regresso a casa, muita gente era atraída pelos pregões apelativos.
Depois vieram os quiosques e os ardinas começaram a desaparecer das ruas das grandes cidades. Com eles se perdeu uma parte da história de Lisboa e Porto. Bem merecida a estátua com que alguém decidiu perpetuá-lo na nossa memória.
Quem sabe onde é que ela está?
Estátua do ardina