
Nas duas últimas décadas os consumidores foram incentivados a endividar-se. O recurso ao crédito permitiu a muitas pessoas terem acesso a uma vasta gama de produtos que de outro modo não teriam possibilidade de adquirir, o que foi muito positivo.
O crédito fácil e os juros baratos incitaram, porém, muitas famílias a endividarem-se para além das suas possibilidades, porque a expectativa de melhoria dos salários as levou a assumir riscos. Com o deflagrar da crise económica e financeira mundial, o crédito tornou-se mais difícil, os juros mais caros, o desemprego cresceu e muitas famílias tornaram-se insolventes, incapazes de cumprir os seus compromissos. Em período de crise financeira, a insolvência das famílias agrava a situação das instituições financeiras, com reflexos incomensuráveis na economia do país.
O sobreendividamento das famílias e das empresas contribuiu inexoravelmente para a derrapagem da dívida, com reflexos negativos na economia. A contracção do consumo ameaça gripar o motor da sociedade de consumo, o apelo à poupança, depois de um período de rédea livre, não é bem aceite pelos consumidores.
No entanto, é inexorável assumir que chegou o momento de mudar de vida e criar modelos com menos impacto negativo na economia mas também mais sustentáveis, sem pôr em causa o desenvolvimento económico.
O cartão de crédito não é propriamente uma varinha de condão capaz de transformar os nossos desejos em realidades, fazendo-nos esquecer que aquilo que adquirimos através dele ( e não com ele, sublinho) tem um preço acrescido a pagar, que se chama juros.Muitas vezes, principalmente em férias ou viagens, esquecemo-nos desse pormenor mas mais tarde, ao fazer as contas, acabamos por concluir que a compra “daquelas pechinchas” se transforma , por força dos juros a pagar, numa “pesada herança” que nos fará recordar as férias com um sabor amargo.
Deixemo-nos de falinhas mansas. A situação a que chegamos ( dívida privada superior a 220 % do PIB) é da responsabilidade de todos. Da Banca que emprestou sem critérios, do Governo que nem sempre fez o que devia para alertar os consumidores para os riscos do sobreendividamento ( embora algumas campanhas nesse sentido- algumas bem esclarecedoras - tenham sido feitas) e dos que tiveram mais olhos do que barriga e se endividaram para além das suas possibilidades.
Claro que há muitos casos de famílias que hoje têm dificuldade em pagar as suas dívidas, porque o desemprego entrou lá em casa, mas ter cinco, seis ou sete créditos pessoais, para satisfazer os apetites consumistas, nunca foi uma boa ideia. Chegou por isso o momento de parar para reflectir e, em vez de culpar apenas o governo e os políticos, assumirmos também as culpas pela quota parte de irresponsabilidade que nos compete. Ou não?