
David Cameron, líder dos conservadores ingleses, recentemente eleito PM, anunciou a construção de um aeroporto na ilha de Santa Helena, projecto abandonado pelos trabalhistas em 2008, alegadamente por questões financeiras.
David Cameron defende a construção do aeroporto na ilha para onde Napoleão foi deportado em 1815 e viria a morrer seis anos mais tarde, enfatizando a necessidade de desenvolver o turismo.
Perdida no Atlântico Sul, tendo como vizinhos mais próximos Ascensão ( 1300 quilómetros) e Tristão da Cunha ( mais de 2000), desconheço o interesse turístico daquele remoto reduto da coroa britânica, habitado por quatro mil pessoas, sem uma única praia na sua costa rochosa e sem outra serventia conhecida para além de prisão inexpugnável.
Sei, outrossim, que a decisão de Cameron desencadeou acesa controvérsia no Reino Unido, com os trabalhistas a acusarem-no de estar a beneficiar os interesses de Lorde Ashcroft, um dos maiores financiadores do partido conservador.Independentemente da justeza das críticas dos trabalhistas, o que me parece é que outros interesses mais obscuros estarão por detrás deste investimento.
Ainda recentemente, José Eduardo dos Santos manifestou a intenção de reivindicar a posse de alguns arquipélagos na costa africana, entre os quais se encontra a ilha de Santa Helena . Por outro lado, apesar de a imprensa portuguesa, sempre desatenta às questões internacionais “menores”, não o noticiar, é conhecido o recrudescimento da polémica em torno das Malvinas/Falkland. A Argentina voltou este ano a reivindicar a posse do arquipélago e tem encetado diligências no sentido de a comunidade internacional- nomeadamente a Organização dos Estados Americanos (OEA)- reconhecer a sua soberania sobre as Malvinas.
A ofensiva diplomática tem surtido efeitos, aumentando os apoios dos países da região às pretensões de Buenos Aires. Não será pois de estranhar se Cristina Kirchner endurecer a sua posição, trazendo de novo para o centro da discussão internacional a questão das Malvinas/ Falkland - que lhes foram roubadas no século XIX pelos ingleses, com recurso à força- embaraçando Cameron e a comunidade europeia.
Neste contexto, embora não sendo previsível, também não é de menosprezar a possibilidade de um aumento de tensão entre Buenos Aires e Londres que poderia, em última análise, redundar no reacendimento do conflito de 1982- determinante para o fim da ditadura argentina.
Ora, somando as pretensões de Angola com as reivindicações argentinas e da comunidade sul-americana, parece-me não ser despicienda a hipótese de este aeroporto na recôndita e inóspita ilha do Atlântico servir, antes de mais, como plataforma de apoio a eventuais conflitos diplomáticos com risco de degenerescência bélica. Ou seja: substituir o interesse turístico por estratégia belicista, talvez seja mais adequado às circunstâncias.